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18/11/2014
O PAPA CONFUNDE MUITOS BISPOS

O PAPA  CONFUNDE MUITOS BISPOS

18/11/2014

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Porque joga em muitos níveis e muitas vezes também se contradiz. É a conclusão de Sandro Magister, que há 40 anos segue de perto os acontecimentos do Vaticano.

Sandro Magister, entrevistado por Goffredo Pistelli - Italia Oggi, 13 de Novembro de 2014 | Tradução: Fabiano Rollim – Fratres in Unum.com

Este ano Sandro Magister celebra 40 anos como jornalista no Vaticano. Seus primeiros artigos na L’Espresso datam de 1974. E atualmente, nas colunas e também no site daquela revista semanal, continua a reportar notícias do Vaticano e da Igreja, com tudo muito bem documentado e sem se curvar a ninguém.

Nascido em 1943, natural de Busto Arsizio, graduado em filosofia e teologia pela “Cattolica”, Magister acompanhou muitos pontífices romanos. Em relação ao último, o papa Francisco, seus artigos distinguem-no da maioria dos jornalistas vaticanos por observar sem hesitações as contradições existentes.

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Pistelli: Magister, o Papa Bergoglio nos últimos meses vem gozando de sucesso mundial, mas algumas de suas decisões têm dado o que pensar. Por exemplo, ele que costuma apresentar-se apenas como Bispo de Roma, no Sínodo sobre a Família evocou cânones do Código de Direito Canônico que reivindicam o poder petrino.

Magister: É verdade, em seu discurso de encerramento.

P.: Delineou uma visão compartilhada e aberta do governo da Igreja, mas por outro lado indicou um comissário externo com métodos linha dura para tratar dos Franciscanos da Imaculada e também colocou de facto uma mordaça nas conferências episcopais.

M.: Algumas, como a italiana, foram de fato aniquiladas.

P.: Falando com os movimentos populares, parecia fazer eco a algumas das análises e trabalhos de Tony Negri, como você escreveu no blog Settimo Cielo. Mas ao mesmo tempo aceitou demitir 500 trabalhadores, entre calígrafos, pintores e gráficos que a Esmolaria Apostólica decidiu não serem mais úteis.

M.: De fato, aquele incidente foi um pouco destoante…

P.: …como destoante ficou sua rígida postura ultra libertária sobre justiça e prisões ao encarcerar preventivamente o ex-núncio da República Dominicana antes do julgamento por pedofilia.

M.: Isso mesmo.

P.: Então, você que tem sido um vaticanista por tanto tempo, o que pensa de tudo isso?

M.: Que essas contradições, e falo isso baseado em evidências observadas ao longo de muitos meses, são inerentes à personalidade de Jorge Bergoglio.

P.: A que conclusões você chega?

M.: É uma pessoa que, ao longo de sua vida e agora como pontífice, agiu em diversas frentes ao mesmo tempo, deixando várias passagens abertas e, à primeira vista, muitas contradições. Mas aquelas que você recordou não são as únicas.

P.: Fale-nos de outras…

M.: Trata-se de um papa muito falante, que telefona, que se aproxima de pessoas muito diversas e muito distantes, mas que silencia diante do caso de Asia Bibi.

P.: A paquistanesa condenada à morte por apostasia, que ficou presa por um longo tempo…

M.: Exato. O papa Francisco não emitiu uma única palavra sobre seu caso. A mesma coisa aconteceu com o caso das meninas nigerianas sequestradas e com aquele ato inacreditável ocorrido há poucos dias no Paquistão quando um casal de esposos cristãos foi queimado vivo em uma fornalha.

P.: São histórias que tem a ver com as relações com o Islã, às quais voltaremos. Mas alguns estão começando a definir essas contradições como um “jesuitismo”, no sentido de um pensamento multifacetado.

M.: Esta é uma avaliação depreciativa e inaceitável, ainda que seja verdade que a espiritualidade jesuíta tenha se mostrado historicamente capaz de se adaptar às mais diversas situações, algumas vezes contraditórias entre si.

P.: E como pareceu contraditória a gestão do recente Sínodo.

M.: Uma gestão precisamente calculada pelo papa e não deixada ao acaso, como se foi levado a crer, e que teve outros elementos contraditórios.

P.: Por exemplo?

M.: Bergoglio tinha dito, e repetidamente, que não queria transigir em relação à doutrina e que estava com a tradição da Igreja. Mas então abriu discussões, como aquela a respeito da Comunhão para os divorciados recasados, que efetivamente mexeram com os fundamentos do Magistério.

P.: Por quê?

M.: Porque é inexorável que a Comunhão para os divorciados recasados resultará na aceitação das segundas uniões e assim na dissolução do laço sacramental do matrimônio.

P.: Não sou um vaticanista, mas a sensação de fora é que o desconforto está crescendo e não apenas na hierarquia. Mais ainda, também em setores que certamente não podem ser definidos como tradicionalistas…

M.: Quanto a isso não há dúvida. Temos líderes em posições expoentes, e não lefebvrianos, que estão deixando isso claro, mesmo que não o expressem em termos drásticos e oposicionistas. Nem mesmo o Cardeal Raymond Leo Burke, ex-prefeito da Signatura Apostólica recentemente removido de seu posto, o fez, porque não há uma corrente pré-concebida hostil ao pontífice. O que é certo é que há manifestações evidentes de desconforto.

P.: Dê-nos um exemplo.

M.: Peguemos o episcopado dos Estados Unidos, isto é, os bispos de uma das mais numerosas populações católicas do mundo. Aquela conferência episcopal, nos últimos anos, tem mantido uma linha coerente e combativa na arena pública, confrontando mesmo certas decisões de Barack Obama em questões éticas. Uma linha compartilhada por muitos prelados proeminentes. Uma coletividade, mais do que uma soma de indivíduos. Um núcleo dirigente, podemos dizer.

P.: E então os americanos?

M.: Estão de alguma forma desconfortáveis. Assim estão cardeais e arcebispos como Timothy Dolan de Nova Iorque, Patrick O’ Malley de Boston, José Gomez de Los Angeles ou Charles Chaput da Filadélfia. Um episcopado de onde vem o próprio Burke, que certamente não está restrito aos círculos tradicionais marginalizados, mas que continua a fazer parte de uma das Igrejas nacionais mais sólidas.

P.: E também a Conferência Episcopal Italiana, como você disse antes, parece estar com um pouco de dificuldade.

M.: Sim, há muitas dificuldades para acompanhar este papa. Com um presidente, Angelo Bagnasco, que parece ter mais dificuldades que todos.

P.: Também porque já se havia indicado abertamente como seu sucessor o Arcebispo de Perugia, Gualtiero Bassetti, criado cardeal por Bergoglio.

M.: Mas, até onde sei, Bassetti também está entre os bispos italianos que estão desconfortáveis.

P.: Entre os italianos, os mais explícitos talvez tenham sido o milanês Angelo Scola e o bolonhês Carlo Caffarra.

M.: Sim, o foram com suas intervenções antes e durante o Sínodo. Mas isso era inevitável considerando a decisão do papa de designar o Cardeal Walter Kasper para abrir as discussões, o que foi na prática a abertura das hostilidades.

P.: Por quê?

M.: Porque Kasper repropõe hoje, tal e qual, a tese derrotada em 1993 pelo binômio João Paulo II e Joseph Ratzinger, este último na posição de prefeito do Santo Ofício na época.

P.: Sim, o papa promoveu Kasper e fez secretário especial do Sínodo o arcebispo Bruno Forte, que assumiu para si os trabalhos a ponto de suscitar reações de alguns padres sinodais. Mas depois, no fim, Francisco interveio batendo nos dois lados. Quase como um velho democrata cristão se colocando contra os extremos opostos.

M.: É outro dos modos expressivos recorrentes deste pontífice: reprimendas de uma parte a outra. Entretanto, se fizermos um inventário, as suas pancadas nos tradicionalistas, nos legalistas e nos defensores rígidos da doutrina parecem ser muito mais numerosas e direcionadas. Por outro lado, quando investe contra os progressistas, não se sabe a quem realmente está se referindo.

P.: O Sínodo promoveu ainda mais o diretor da Civiltà Cattolica, padre Antonio Spadaro.

M.: Sim, ele posa agora como um porta-voz do papa, e a revista jesuíta, que se encontrava em um progressivo declínio (já com ele como diretor, dedicava-se muito à internet e às redes sociais), hoje é expressão do vértice supremo do Vaticano — especialmente após a primeira entrevista com o papa jesuíta. Enquanto isso, o ghostwriter de Francisco é Manuel Fernandez, reitor da Universidade Católica de Buenos Aires, a quem o papa fez arcebispo. Foi com Fernandez que Francisco escreveu a Evangeli Gaudium, assim como escreveu com ele o Documento de Aparecida no Brasil, em 2007, quando o então arcebispo de Buenos Aires conduziu ao porto a conferência do episcopado latino-americano. Aquele documento é para muitos uma antecipação deste papado.

P.: Diante de um grande consenso, há aqueles que, como o escritor Antonio Socci, contestam até a validade da eleição do papa. Você leu seu livro “Não é Francisco” (Non è Francesco, Ed. Mondadori)?

M.: Li em uma noite, em um só fôlego, apesar de serem mais de 300 páginas. E não por causa da tese da eleição inválida: resultado do cancelamento de uma votação no conclave porque teria havido uma maioria de votos brancos. Uma tese que a mim parece inconsistente.

P.: Mas por que então a leitura foi interessante?

M.: Por aquilo que está determinando o sucesso do livro, a ponto de ter alcançado o topo da lista de best-sellers, ultrapassando os livros de e sobre Bergoglio. É porque ele reconstrói, com fatos e palavras incontestáveis, as contradições que citamos.

P.: Um livro de que ninguém fala, quase como se pudesse ameaçar a popularidade de Francisco, que é enorme. A despeito desta, entretanto, a prática religiosa não aumenta e, pelo contrário, cresce a aversão, também publicamente, ao catolicismo. Bergoglio sim, o resto não.

M.: Também a popularidade de seus predecessores, não esqueçamos, era fortíssima. João Paulo II conheceu o sucesso mundial e não apenas durante os anos de sua enfermidade. E também Bento XVI, entre 2007 e 2008, alcançou os índices mais altos nas pesquisas, mesmo que tenhamos esquecido isso. Sua viagem aos Estados Unidos foi o cume, com uma grande e positiva acolhida também da parte da opinião pública laica.

P.: E então qual é a diferença?

M.: É que os predecessores eram populares sobretudo dentro da Igreja, ainda que fossem contestados asperamente pelos focos de opinião pública não cristã. Já a popularidade de Francisco é mais marcante do lado de fora, ainda que não provoque ondas de conversões. Na verdade, com ele há uma certa satisfação por parte da cultura estranha ou mesmo hostil ao cristianismo.

P.: Em que sentido?

M.: Em ver que a Cabeça da Igreja está se voltando mais para a direção de suas posições, as quais parece compreender e mesmo aceitar. A história das entrevistas repetidas com Eugenio Scalfari é exemplar: o papa aceita que o fundador de Repubblica, até então o contestador mais duro dos pontífices, publique destas entrevistas tudo aquilo que desejar.

P.: De fato, o próprio Scalfari disse que publicou coisas que Bergoglio não tinha dito.

M.: Exato. Mas, em tudo isso, ele não se aproximou do cristianismo. O cristianismo na boca de Bergoglio não é mais provocante, não cria problemas como no passado, pode ser tratado com cortesia, superioridade e distância. O cristianismo conta menos. Basta pensar no primeiro-ministro, Matteo Renzi, católico, que não está nem aí para o que a Conferência Episcopal Italiana está fazendo. Em suma, de uma situação de confronto ou de conflito, passamos ao desinteresse.

P.: Sobre o mundo muçulmano o papa Francisco mantém o silencio. E também o secretário de estado, Pietro Parolin, intervindo recentemente na ONU, foi muito prudente. Alguns falam de uma grande cautela, e quando o fazem, citam o discurso de Bento XVI em Ratisbona, que provocou reações e até mortes.

M.: É uma cautela levada ao extremo que, entretanto, concretamente, não vejo produzir vantagem, nem me parece resultar em nenhuma ajuda, ainda que mínima ou parcial, aos cristãos daquelas regiões. A cautela é compreensível se medida em proporção ao efeito, e válida se produz um dano menor. A situação me recorda o silêncio de Pio XII em relação aos judeus.

P.: Uma polêmica histórica, mas também recente…

M.: o papa Pacelli fez tudo para salvar os israelitas, mesmo pessoalmente no Vaticano, agora o sabemos. Mas hesitou em denunciar abertamente a coisa, temendo que acontecesse o mesmo que na Holanda, onde após a denúncia por parte de alguns bispos, seguiram-se perseguições ainda piores.

P.: Mas esse silêncio permanece.

M.: Salvo o cardeal Jean Louis Tauran, prefeito da Congregação para o Diálogo Inter-Religioso, que não se poupa em suas condenações severas.

P.: E qual é o ponto?

M.: É que temos um poder como o ISIS e nos apressamos em dizer que o Islã não tem nada com isso, quando na verdade aqueles são alimentados por um islamismo radical, que não resolve a questão da racionalidade e a relação entre fé e violência. Isso é exatamente o que foi denunciado pelo papa Ratzinger em Ratisbona. De fato o único diálogo verdadeiro entre o cristianismo e o islã nasceu daquele discurso, com a subsequente carta dos 138 estudiosos muçulmanos.

P.: Mesmo que a visita ao sultão Ahmed Mosque em Istambul um ano depois tenha sido considerada uma reparação da parte de Bento XVI.

M.: Ratzinger pôde fazer aquele gesto justamente por haver dito aquelas coisas em Ratisbona. Sua crítica não foi enigmática, foi bem entendida. Ele a havia expresso com clareza cristalina.

P.: E Francisco é claro?

M.: Às vezes não. Quando esteve em Belém, parou em frente ao muro que divide o território de Israel e lá permaneceu em silêncio absoluto: não sabemos o que quis dizer com isso. E quando em Lampedusa grita “vergonha!” não está claro quem e por que deve se envergonhar. É a Itália, que salvou milhares e milhares de vidas? Por que não o diz? Muitas vezes, há palavras e gestos que são deliberadamente deixados na incerteza.

P.: Não temos tempo de falar sobre acontecimentos do Vaticano, como o caso de Ettore Gotti Tedeschi, removido do IOR pelo cardeal Tarcisio Bertone, mas cuja honestidade tem sido repetidamente demonstrada. Ainda mais com o arquivamento do caso pelo judiciário italiano.

M.: Sua reabilitação tem sido negada. Ele pediu uma entrevista com o papa, mas sua solicitação foi recusada.

P.: A Igreja “hospital de campanha” às vezes está com as portas fechadas.

M.: É assim.

 

Crédito: Rorate-Caeli

 

Fonte:http://fratresinunum.com/2014/11/18/o-papa-confunde-muitos-bispos/




Artigo Visto: 2016

 




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